A Sabedoria de Um Caminho de 50 Anos

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Meio Século de Karaté: A Caminhada de Vida do Sensei Carlos Maurício no Barreiro Carlos Maurício, uma figura incontornável do Karaté no concelho do Barreiro e mestre de várias gerações de praticantes. Numa postura tranquila, de quem já viveu tudo o que tinha para viver neste desporto, o Sensei fala com a serenidade de quem compreende a profundidade do caminho que percorreu. No interior do Grupo Desportivo Ferroviários do Barreiro (GDFB), clube que se tornou a sua casa desde 1983, e onde ainda hoje ecoam as vozes dos muitos alunos que por ali passaram. A entrevista decorre com a consciência de que estamos perante um testemunho raro: o de alguém que viveu o Karaté antes de este ser uma moda, antes de haver competições televisivas, antes de existir redes sociais para o promoverem. Um Karaté mais autêntico, mais íntimo, mais exigente 1. O que o motivou, há 50 anos, a iniciar a prática de Karaté e o que o continua a motivar hoje? A pergunta abre inevitavelmente as portas da memória. O Sensei sorri com nostalgia, recordando um tempo em que o mundo era outro — sem smartphones, sem academias em cada esquina, sem discursos sobre bullying ou insegurança. A sua resposta desmonta por completo a visão contemporânea de que o Karaté surge como remédio para fragilidades sociais: “Nesses anos o que me trouxe, e grande parte de quem se iniciou comigo, não foi a insegurança, o tão moderno bullying, ou qualquer desequilíbrio emocional. Foi simplesmente a novidade da altura… o Bruce Lee.” A simplicidade da motivação — um ídolo de cinema — contrasta com a profundidade que a prática ganharia depois. Bruce Lee foi, para muitos da sua geração, a porta de entrada para algo que ultrapassava os filmes: era a promessa de força, agilidade, disciplina… e, acima de tudo, mistério. Para um jovem dos anos 70, isso era suficiente para dar o primeiro passo. 2. Como descreve o impacto que o Karaté teve na sua vida pessoal e profissional? “Como grande parte do Desporto quando bem dirigido e orientado, neste caso principalmente no âmbito das chamadas ‘Artes Marciais’ ou Desportos de Combate, primeiro que tudo as Amizades, que hoje ainda se mantém, depois a Auto Disciplina, a Resiliência de insistir e persistir em vez de desistir como é hoje tão frequente, e por ultimo a Confiança de estar a vários níveis em situações difíceis ou de stress e manter mais do que a calma, o controle quase absoluto do medo, que nunca se deixa de sentir, e é muito bom conselheiro, mas que controlado, nos transmite uma sensação de domínio da situação, que é excelente.” A resposta do Sensei evidencia de forma clara a profundidade com que o Karaté moldou o seu percurso humano e desportivo. Não se trata apenas de uma prática física; trata-se de um caminho que influencia a personalidade, o carácter e a forma de estar na vida. As Amizades que permanecem ao longo de décadas revelam a dimensão comunitária da modalidade: o dojo como espaço de encontro, respeito e crescimento conjunto. A Auto Disciplina e a Resiliência, que o Sensei identifica como centrais, são pilares essenciais não só para o treino, mas para o quotidiano — a capacidade de insistir, persistir e não desistir, especialmente num tempo em que a facilidade e a desistência rápida parecem dominar os comportamentos mais jovens. A referência ao “controle quase absoluto do medo” mostra a maturidade que o Karaté proporciona: o medo não desaparece, mas transforma-se num conselheiro prudente, canalizando serenidade, foco e confiança. Esta capacidade de manter o domínio emocional em situações de tensão é um dos maiores legados das Artes Marciais, e o Sensei transmite-o com enorme lucidez. Em conjunto, estes elementos mostram que o impacto do Karaté vai muito além da técnica — ele forma pessoas mais equilibradas, mais consistentes e mais preparadas para enfrentar adversidades, confirmando porque razão esta modalidade o acompanha há tantas décadas. 3. Durante o seu percurso, qual foi o momento ou desafio mais marcante? QO Sensei começa por destacar que, ao longo da sua prática, os momentos mais marcantes foram sempre aqueles em que teve de se sujeitar a avaliações formais. “Durante este percurso, para mim os momentos mais marcantes, tem sido sempre que tenho de me sujeitar a Exames de Graduação…” Estes momentos representam para ele não apenas um teste técnico, mas uma prova de superação pessoal, exigindo concentração, rigor e autoconhecimento. A preparação para estes exames, e o facto de colocar a sua evolução à prova, demonstra o compromisso profundo com a modalidade. Ao mesmo tempo, o Sensei sublinha que também o marcou profundamente estar “do outro lado”, enquanto avaliador. “…bem como quando estou num Júri de Exames e tenho que avaliar a prestação de terceiros para passagem de graduação.” Aqui, o desafio deixa de ser individual e passa a ser de responsabilidade coletiva: garantir que os princípios do Karaté são preservados e transmitidos corretamente. Avaliar não é apenas observar técnica — é perpetuar valores, exigir verdade e reconhecer mérito. O Sensei explica ainda que os maiores desafios dos últimos anos deixaram de ser internos e passaram a surgir na relação com os praticantes. “Em termos de desafios, aí o caso muda de figura, e esses têm-se tornado cada vez mais exigentes, porque se centram em fazer passar os princípios, os valores e os conhecimentos aos meus alunos ou praticantes…” Esta dimensão pedagógica, que é central no papel de um mestre, tornou-se mais exigente devido às mudanças socioculturais que afetam especialmente os mais jovens. “…principalmente aos mais novos que cada vez mais, hoje em dia fruto do deficit ou facilitismos na educação que recebem, é-lhes promovida em excesso ideias de autoestima e de autoimagem, dando-lhes a ideia de que tudo lhes é possível e permitido, banalizando o princípio fundamental da meritocracia.” O Sensei aponta um problema real e atual: a crescente dificuldade em transmitir valores como esforço, resiliência e disciplina num contexto que privilegia o imediato e muitas vezes esquece a importância de merecer e conquistar. 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GDFB lança ciclo de entrevistas para dar rosto à história do clube

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O Grupo Desportivo Ferroviários do Barreiro vai iniciar um novo ciclo de entrevistas dedicado a atletas, ex-atletas, treinadores, ex-treinadores e a todos aqueles que, ao longo das décadas, contribuíram para o crescimento e identidade do nosso clube. Com esta iniciativa, pretendemos dar rosto ao GDFB, valorizando as pessoas que fizeram — e continuam a fazer — parte da nossa história. O objetivo é registar testemunhos, ideias, memórias e trajetos de vida que ajudam a construir os alicerces do que somos hoje. As entrevistas serão publicadas de forma aleatória, dependendo da disponibilidade dos intervenientes. A escolha das pessoas entrevistadas será sempre uma surpresa, conhecida apenas pelos próprios no momento certo. Quem já foi entrevistado é convidado a guardar essa informação, para que todos possam partilhar deste mistério saudável que queremos manter ao longo do projeto. Também a periodicidade das entrevistas será variável, reforçando o caráter espontâneo e autêntico desta iniciativa. E para dar o pontapé de saída, começamos com alguém que dispensa apresentações: o nosso treinador Carlos Maurício, uma das figuras mais marcantes do Karaté no GDFB e no concelho do Barreiro. O seu testemunho será o primeiro desta série que promete inspirar, recordar e valorizar décadas de dedicação ao clube. Acreditamos que este ciclo de entrevistas será uma forma valiosa de preservar a nossa história, reforçar os nossos laços e celebrar aqueles que dedicaram parte das suas vidas ao GDFB. Seguimos juntos — a construir memória, identidade e futuro